terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Haikai da decomposição

As formigas subindo
Em meu rosto esfacelado
De migalhas de pão

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Arcaísmos

Eu não vou fazer poesias modernas
Pode estar frio
Posso não ter dinheiro
Só varizes nas pernas

Eu não vou recitar uma mentira
Ladeada por palavras difíceis
Entremeadas por versos bonitos
Mas que não vale o ar que respira

Eu vou encher o meu peito
Mesmo que transborde e putrefaça
Florescendo o imperfeito

Eu vou lutar contra a corrente
Me esfacelando na métrica velha
Do poeta mais impotente

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Metalinguagem e babushkas

O fazer da poesia
Vem do fundo das tripas
Tanto corre que gritas:
- Alegria, alegria

O poeta que fala
Que quer revelar o segredo
É apenas um animal com medo
Escondido no canto da sala

A poesia dentro da poesia
São os ossos do ofício
Que não se conhece de início
Toma conta de tua cria

É como as bonecas russas
Saindo uma de dentro da outra
Como sai a poesia da poesia
Na folha de papel

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Recordação

Foi assim
Lembrei de teus braços
E voltei a mim

E aí então
Lembrei dos teus beijos
E fiz uma canção

Passou um segundo
Lembrei de teus olhos
E conquistei o mundo

Depois disso tudo
Lembrei que era um sonho
E desencontrei-me mudo

sábado, 14 de novembro de 2009

Meus sete anos

Foi a vela na gelatina
Na enorme casa vazia
O cachorro quente da esquina
E depois a cama fria
Mergulhava no jardim
E mirava as ermas paragens
Os segundos eram sem fim
O mundo, a partir da garagem

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Entreguista do amor

Sou uma entreguista do amor
Não tenho mais controle sobre mim
Minhas ações são a medida da minha dor
Não queria me vender assim

Meu coração é um setor chave
Não sei como liberalizei
Acho que não queria nenhum entrave
Que vença o mais forte, é a lei

Delego-te minha administração
Só prometa que de seus abraços
Não haverá expatriação


Ai, ai, terceiro ano afetando até a minha produção literária...

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Questões

Será que posso parar de pensar em você?
Privar minha mente desse alimento?
Deixá-la se esvair com a inanição?
Sucumbir a este tormento?

Será que devo te esquecer?
Meia volta volver?
Partir sem nem olhar para trás...
... Jamais?

Será que devo me esconder
Por trás dos muros do meu temor?
Acordar ofegante à noite
Me perguntando se isso é amor?

Ou será que me entrego
À tua onipresença em mim
E vivo esse instante cego?

domingo, 25 de outubro de 2009

Ser passageiro do 584

Ser passageiro do 584 não é esperar qualquer ônibus: é muito mais! Ser passageiro do 584 é ter certeza de que perder uma oportunidade é fatal. É empreender uma aventura de consequências inesperadas; é dar a cara a tapa e enfrentar o que vem pela frente.
Ser passageiro do 584 é se postar do lado da rua oposto ao ponto de ônibus, ver um deles passando do outro lado, e rezar fervorosamente para que o sinal feche e você consiga pegá-lo – o que, na grande maioria das vezes, não acontece. É morrer de raiva quando você está prestes a entrar no ônibus e a pessoa à sua frente faz a pior pergunta que a nata do 584 pode ouvir, já que a negativa lhe é óbvia: “Passa no Largo do Machado?”, e ser obrigado a abrir espaço para que essa criatura boçal saia. Pela porta da frente.
É ficar horas esperando no ponto, para que cheguem dois ônibus seguidos. Ou, pior ainda, esperar, esperar, esperar, para que chegue um dos velhos, cheio como uma lata de sardinha, e ir sacudindo até o destino final. Pode ficar pior: quando se está dentro da lata de sardinhas, olhar para o lado e ver um 584 novo e vazio, cortando as ruas lépido e fagueiro.
Ser passageiro do 584 é ter certeza de que nos dias de calor escaldante virá um ônibus sem ar e nos dias de chuva e frio o ar condicionado é pedida certa. É sentir um frio na barriga na hora da virada para a Farani, na qual o motorista sempre faz uma curva acentuada, ameaçando seguir para a Praia do Flamengo. Você pega o ônibus todos os dias, mas ainda cai nessa.

Livre adaptação da crônica "Ser Brotinho" de Paulo Mendes Campos

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Da janela da área de serviço

Da janela da área de serviço
Posso ver um real à parte
Não tenho nada a ver com isso
Mas permita-me transformá-lo em arte

Posso ver nuvens pesadas
E o bosque de carros silvestres
Posso sentir a passada
Do pesado coração dos pedestres

Posso ver outras varandas
Me apresentarem outras vidas
As janelas indiscretas
E o cheiro branco das comidas

Mas quando cai a noite fria
E o sereno se espalha
Me recolho na agonia
E a janela se estraçalha

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Fui

Uma hora para ir embora
Escapar por entre os dedos
Na sarjeta sem demora
Lado a lado com meus medos

Pego um voo pro infinito
Vou aos trancos e barrancos
Me sufoco com meus gritos
E desabo dos tamancos

Vou embora na alvorada
No amargor da casa tua
Devoro a porta de entrada
E me misturo ao breu da rua

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Caos

E eu me sinto tão vazia
Diante da torneira pingando na pia
Entregue ao ócio do lar tão vazio
Das portas trancadas não sai nem um pio

Me afundo no poço das velhas perguntas
O peso do corpo magoa as juntas
Vou despedaçando as velhas lembranças
Das tempestades que nunca conheceram bonanças

Mergulho a cabeça no mar da derrota
Me sinto um samba de uma só nota
Esmago os pedaços de uma melodia
E rasgo as cortinas no raiar do dia

sábado, 15 de agosto de 2009

Vamos ser uma boa menina

Vamos ser uma boa menina
Entrar pela porta da frente
Cumprimentar

Vamos ser uma boa menina
Usar o colar que foi presente
Conversar

Vamos ser uma boa menina
Colocar o cinto no banco da frente
Estudar

Vamos ser uma boa menina
Ganhar um olhar de aprovação
E um carro

Enquanto as outras meninas
Errantes nas esquinas
Olham e assopram
Fumaça

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Traços

Seu olhar aéreo
Parece não me levar a sério
Enquanto passeia perdido
Pelo meu corpo moído

Seu sorriso largo
Esconde um gosto amargo
Deixado pelo último beijo
Jogado na cova do desejo

E suas mãos
Jogam-me um aceno
Melancolicamente distante
Quase obsceno


Saudades...

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Deixa estar

Pra aprender
É andar
E deixar transparecer

Pra você ver
Que assim não funciona
Não tente prever

No seu campo de pregos
Não é você quem manda
Você vai enlouquecer

Em terra de acaso
É rei
Quem consegue esquecer

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Perdas

Já perdi um olhar
Jogado a esmo
Numa estrada que não dá em nada
Dando sempre no mesmo

Já perdi a conta
Das vezes que me perdi em você
Para tentar me achar em algum lugar
Onde você não pudesse me ver

Já perdi a cabeça
Na guilhotina da sua voz
Que não permite que eu esqueça

E não acho
Por mais que procure
Não acho

domingo, 19 de julho de 2009

Meia Hora

Meia hora mais claro
Eu vejo pela janela
Meia hora exala
Teu cravo e tua canela

Meia hora depois
O sono profundo
Meia hora mais tarde
Acabou-se o mundo

O que será da meia hora
Se os desejos do fundo
Se procriam agora?

O tolo respira
E um segundo ofegante
A meia hora vira


Domingo nublado é tão bonito!!!

sábado, 11 de julho de 2009

Nascer

O amor nasce no lodo
É como um rodo
Que passa e arrasta
A essência de si

O amor nasce no lixo
É como um bicho
Que precisa de espaço
Para poder viver

O amor nasce do nada
É como uma enxada
Cravada no solo
Do meu coração

O amor nasce em mim
E caminha para o fim
Morrendo aos poucos
Deixando-nos loucos

terça-feira, 7 de julho de 2009

Saudades

Não vou deixar
Que nada te leve
Que o tempo te apague
Que a distância te sugue

Não pode ser
Ninguém se atreve
Ninguém vai mexer

Não são meus olhos
(ou talvez sejam somente)
Talvez sejam os seus
A me olhar
Sob o sol

Ah, se eu pudesse
Te guardar na carteira

domingo, 5 de julho de 2009

The Breakfast Club

“A pergunta crucial numa relação é: ‘você quer tomar café-da-manhã com essa pessoa?’ qualquer imbecil pode dizer ‘vamos para a cama...’ Mas o café da manhã, a conversa...”
Nesses dias atribulados de viver na minha cabeça, essa frase do Gay Talese caiu como uma luva. Num domingo de manhã em que eu, contrariando todos os meus costumes de enjôo matinal... tomei café. Abri o jornal e lá estava ela, me fazendo entender toda a somatização e nojinho que eu estava tendo. O café da manhã é a cereja do bolo, cuja massa é feita de conversas e garrafas de cerveja no chão, o recheio, de lençóis e a cobertura, dos pés e cabelos misturados. Se você não ta a fim da cereja, melhor ir dizendo tchau pra tudo que veio antes dela.
Nessa mesma manhã, fui ler High Fidelity e dei de cara com uma parte que a Marie diz para o Rob “When I said before that I hoped it wasn’t the end of the evening I was, you know... Talking about breakfast and stuff. I wasn’t talking about another whiskey and another ten minutes of shooting the shit. I’d like it if you could stay the night”. E alguns dias antes eu estava vendo um episódio de Sex and the City, em que a Carrie dorme na casa do Alexander e na manhã seguinte ele faz panquecas para ela. Depois ela fica se perguntando se ele faz aquilo para todas. Depois de tanto tempo desprezando a refeição dos Sucrilhos Kellog’s, agora eu vejo como ela ta em todo lugar. É só andar pelas ruas do Leblon pra ver o Cafeína lotado, o Talho Capixaba com espera... Todo mundo querendo começar o dia com alguma coisa especial.
De agora em diante minha busca pela alma gêmea vai ser baseada no quanto eu estarei disposta a dividir uma omelete com alguém ou se eu quero que essa pessoa coloque granola no meu iogurte. Nem que eu precise fazer uma terapia anti enjôo matinal. Vamos vestir a camisa do café da manhã. Ou, quem sabe, a camisa do cara para tomar café da manhã no dia seguinte.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Processo

Saudades do começo
Onde era tudo mais suave
Onde eu sentia teus cabelos
E tuas costas suadas

Saudades do meio
Onde era tudo mais claro
Teu cabelo já era ralo
E tuas costas, distantes

Saudades do fim
Onde já não sentia nada
O cabelo caído
E as costas quebradas


Até encaixa! Não sequei o cabelo e mesmo assim não adiantou nada

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Hoje o dia amanheceu quadrado
Virei e não te vi do meu lado
E tudo se reduziu a pó

O céu se ostenta arranhado
Meu passo é tão pesado
Meu coração é um nó

As horas escorrem lentamente
Eu me levanto de repente
Para depois cair em mim

Não me diga coisas bonitas
Me deseje as mais malditas
E proclame nosso fim

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Pra sair da rotina, nada como a gripe suína

É com imenso prazer que eu começo esse blog. Essa vida de terceiro ano me impossibilita de ter tempo pra fazer isso, mas por uma causa nobilíssima e bela obra do destino eu estou aqui.

Domingo teve uerj, e depois de analisar todas as circunstâncias me dei conta de toda a merda que rondou minha prova.
Na véspera, comecei a ficar gripada (não suinamente). Dormi mal. Acordei pior. Fui fazer a prova na ufrj. Entrou um rato na minha sala. Os biscoitos de rodoviária piraquê chocolate da garota ao meu lado cairam todos no chão. Não tive tempo de fazer a prova direito. Saí, pisei na merda e meu tênis ficou imundo. Tirei B na prova.
Estava a amaldiçoar tudo no domingo, mas desde então as coisas foram melhorando gradativamente. Até culminar no dia de hoje, em que todas as forças do universo resolveram se reconciliar comigo!

Tudo começou às 9h na aula de Português. Disseram que uma garota estava com suspeita de gripe suína. "Ah, claro que é sacanagem isso" era o que todo mundo dizia. Até que começou a percorrer o colégio a história dos casos que foram detectados e a quarentena do primeiro ano. Rebuliço geral, às 11 da manhã já tava na globo.com, todo mundo ligando e perguntando. Enquanto isso, eu e as meninas articulando a campanha "Quarentena já". E aí eis que liga a secretária da minha médica, pra confirmar a fatídica consulta das 15h40 do dia seguinte que me tiraria do meio do churrasco de turma e à qual eu estava indo totalmente a contragosto e que já tinha gerado mil dilemas e marca-desmarca na minha vida. Só que aí a secretária LINDA fala que tem horário livre 13h! Ahhhhhhhh, êxtase! Chegar no churrasco de turma cedo e ter tequila garantida!
Saio pra almoçar, repórteres aglomerados na porta, entrevista pro dia e pra band (chique, ném). Volto pro colégio. Notícia 1: prova do dia seguinte cancelada! Coro dos anjos. Legal, vamos pra aula. Aula vai correndo a tarde, incerteza geral, boatos se alastrando até que, diretor geral na sala e notícia 2: UMA SEMANA DE "QUARENTENA" (diretor diz "nada de ir a shopping"). Deuses me amaaaaaaaaaaaaam. Uma semana livre desse inferno, amanhã tem médico na hora boa, churrasco de turma com tequila, bg de noite, sem aula sexta, praia, casa rosa, fazer todas as coisas da minha lista, coçar o saco, seja o que for!

Vão em frente, me chamem de burguesa individualista (e o outro lá todo fudido - no caso o outro o suinamente gripado), não me importo. Essa vai ser a week to remember e deteriorarei meu fígado como se não houvesse amanhã. Eu sou a miss neurose, mas "vamos perder aula e ficar atrás de vários colégios no vestibular". Ahhhhhhhhhhhhh get over it. Amanhã é o início da age of aquarius! E viva a gripe suína!