Ser passageiro do 584 não é esperar qualquer ônibus: é muito mais! Ser passageiro do 584 é ter certeza de que perder uma oportunidade é fatal. É empreender uma aventura de consequências inesperadas; é dar a cara a tapa e enfrentar o que vem pela frente.
Ser passageiro do 584 é se postar do lado da rua oposto ao ponto de ônibus, ver um deles passando do outro lado, e rezar fervorosamente para que o sinal feche e você consiga pegá-lo – o que, na grande maioria das vezes, não acontece. É morrer de raiva quando você está prestes a entrar no ônibus e a pessoa à sua frente faz a pior pergunta que a nata do 584 pode ouvir, já que a negativa lhe é óbvia: “Passa no Largo do Machado?”, e ser obrigado a abrir espaço para que essa criatura boçal saia. Pela porta da frente.
É ficar horas esperando no ponto, para que cheguem dois ônibus seguidos. Ou, pior ainda, esperar, esperar, esperar, para que chegue um dos velhos, cheio como uma lata de sardinha, e ir sacudindo até o destino final. Pode ficar pior: quando se está dentro da lata de sardinhas, olhar para o lado e ver um 584 novo e vazio, cortando as ruas lépido e fagueiro.
Ser passageiro do 584 é ter certeza de que nos dias de calor escaldante virá um ônibus sem ar e nos dias de chuva e frio o ar condicionado é pedida certa. É sentir um frio na barriga na hora da virada para a Farani, na qual o motorista sempre faz uma curva acentuada, ameaçando seguir para a Praia do Flamengo. Você pega o ônibus todos os dias, mas ainda cai nessa.
Livre adaptação da crônica "Ser Brotinho" de Paulo Mendes Campos
domingo, 25 de outubro de 2009
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Da janela da área de serviço
Da janela da área de serviço
Posso ver um real à parte
Não tenho nada a ver com isso
Mas permita-me transformá-lo em arte
Posso ver nuvens pesadas
E o bosque de carros silvestres
Posso sentir a passada
Do pesado coração dos pedestres
Posso ver outras varandas
Me apresentarem outras vidas
As janelas indiscretas
E o cheiro branco das comidas
Mas quando cai a noite fria
E o sereno se espalha
Me recolho na agonia
E a janela se estraçalha
Posso ver um real à parte
Não tenho nada a ver com isso
Mas permita-me transformá-lo em arte
Posso ver nuvens pesadas
E o bosque de carros silvestres
Posso sentir a passada
Do pesado coração dos pedestres
Posso ver outras varandas
Me apresentarem outras vidas
As janelas indiscretas
E o cheiro branco das comidas
Mas quando cai a noite fria
E o sereno se espalha
Me recolho na agonia
E a janela se estraçalha
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